Com implementação do Sistema de Informação Cadastral Simplificado (BUPI) não se encontra na legislação (ou na documentação de suporte), qualquer referência expressa que permita decidir se, na georreferenciação de um prédio, deve atender à i) realidade material atual; ii) aos elementos resultantes da matriz; iii) ou ao do registo.
Tanto quanto julgo saber esta omissão é propositada, no essencial para evitar que se discuta o problema, qualquer coisa como, manter os esqueletos escondidos...
No fundo todos sabemos que o "rei vai nu", mas vamos todos enganando e sendo enganados, bastando para tal que se utilizem algumas fórmulas mágicas, tais como:
Estas fórmulas são transversalmente utilizadas e vão servindo, com maior ou menor permissividade, na generalidade do território onde vigora a matriz "não cadastral".
O uso (e abuso) destas fórmulas é de tal maneira difundida que a esmagadora maioria das pessoas (inclusive profissionais) perderam completamente a consciência do alcance das declarações tendo-se tornando-se uma ladainha sem qualquer sentido.
As conservatórias não têm outro remédio que aceitar o "ato de contrição" e dar a sua "absolvição", ainda que estejam plenamente convencidas de que o pecador não está minimamente arrependido.
Continuamos a ter um sistema de registo de direito aparentemente protetor, mas que versa sobre objetos absolutamente incertos.
Com o Novo Regime Jurídico do Cadastro Predial (artigo 16º) "Os dados de caracterização de um prédio cadastrado constituem presunção da sua real localização, configuração e área para todos os efeitos legais..." mas que pode ser ilidida "mediante prova do contrário".
Tratando-se de presunção ilidível, como tal sem força probatória plena, o real alcance desta “presunção” só vai ser descoberto mais tarde, em função do que vier a ser objeto de debate nos tribunais.
A conjugação com o nº 3 e 4 deverá ser objeto de profundo debate, muito particularmente quando é referido “…não prevalecem sobre o cumprimento das disposições legais e regulamentares aplicáveis".
No artigo 15º, que versa sobre a "harmonização cadastral" é referido que a integração na carta cadastral deve ser assegurar a harmonização da informação dos prédios, mediante a correspondência com entre a inscrição do prédio cadastrado na carta cadastral, o número da descrição do registo predial e o artigo da inscrição matricial".
Vamos então a um caso prático:
O Sr. José recebeu, através de partilha judicial, em nos anos 60 (do século XX) um prédio rústico chamado de Leira de Cima, inscrito na então matriz rústica sob o artigo 345, descrito na conservatória sob o nº 25.555. Nessa data o prédio tinha a configuração constante da imagem 1, com a área aproximada de 600 m2.
Ainda nos anos 60, pouco depois da partilha "comprou" verbalmente ao seu irmão o prédio rústico chamado de "Leira de Baixo", inscrito na matriz sob o artigo 346, sendo que nunca formalizou a escritura de compra e venda. O artigo 346 tinha também cerca de 600 m2.
Pouco depois do 25 de abril foi aberta uma nova estrada e antigo caminho deixou de ter "serventia", pelo que foi paulatinamente ocupado pelo Sr. José.
No início dos anos 80 tiveram lugar as avaliações gerais da matriz rústica e foi criado um só artigo que o perito calculou (a olho) ter 1600 m2, e atribuído um novo artigo rústico 1201.
Pouco depois Sr. José construiu uma pequena casa, que acabou por vir a ser inscrita na matriz sob o artigo urbano 999, sem que nunca tivessem atualizado a área do prédio rústico. A casa foi construída, em grande parte, sobre o terreno do que era o antigo caminho.
Em 1983 o Sr. José divorciou-se e nas partilhas ficou a casa para a ex-mulher e o artigo 1201 (rústico) para ele. Ninguém se preocupou em fazer registos.
Em 2022 o Sr. José faleceu, tendo como único herdeiro um filho de 2º casamento.
Parece confuso? ...mas também é habitual.
Tendo agora de fazer o "BUPI" / cadastro do artigo 1201 (rústico) o que devo georreferenciar?
A esta 1ª pergunta não tenho dúvida em responder - apesar de inexistir norma expressa que o suporte - que deve ser georreferenciada a realidade material atual, ou seja, o polígono dos limites da parcela detida atualmente herdeiro do Sr. José, delimitada pelas respetivas estremas, relegando para uma 2ª fase a forma de alcançar a harmonização.
Validada que está a RGG (com 730 m2) temos então de harmonizar a informação de cadastro / matriz / registo, apresentando lado a lado a solução pragmática e a solução legal:
Tanto quanto julgo saber esta omissão é propositada, no essencial para evitar que se discuta o problema, qualquer coisa como, manter os esqueletos escondidos...
No fundo todos sabemos que o "rei vai nu", mas vamos todos enganando e sendo enganados, bastando para tal que se utilizem algumas fórmulas mágicas, tais como:
- A divergência provém de simples erro de medição;
- Aa configuração geométrica do prédio não sofreu alteração;
- Desconhece a anterior correspondência matricial;
- Desconhece os 2º ante-possuidores, sendo que o prédio estava na posse do ante-possuidores há mais de 20 anos.
Estas fórmulas são transversalmente utilizadas e vão servindo, com maior ou menor permissividade, na generalidade do território onde vigora a matriz "não cadastral".
O uso (e abuso) destas fórmulas é de tal maneira difundida que a esmagadora maioria das pessoas (inclusive profissionais) perderam completamente a consciência do alcance das declarações tendo-se tornando-se uma ladainha sem qualquer sentido.
As conservatórias não têm outro remédio que aceitar o "ato de contrição" e dar a sua "absolvição", ainda que estejam plenamente convencidas de que o pecador não está minimamente arrependido.
Continuamos a ter um sistema de registo de direito aparentemente protetor, mas que versa sobre objetos absolutamente incertos.
Com o Novo Regime Jurídico do Cadastro Predial (artigo 16º) "Os dados de caracterização de um prédio cadastrado constituem presunção da sua real localização, configuração e área para todos os efeitos legais..." mas que pode ser ilidida "mediante prova do contrário".
Tratando-se de presunção ilidível, como tal sem força probatória plena, o real alcance desta “presunção” só vai ser descoberto mais tarde, em função do que vier a ser objeto de debate nos tribunais.
A conjugação com o nº 3 e 4 deverá ser objeto de profundo debate, muito particularmente quando é referido “…não prevalecem sobre o cumprimento das disposições legais e regulamentares aplicáveis".
No artigo 15º, que versa sobre a "harmonização cadastral" é referido que a integração na carta cadastral deve ser assegurar a harmonização da informação dos prédios, mediante a correspondência com entre a inscrição do prédio cadastrado na carta cadastral, o número da descrição do registo predial e o artigo da inscrição matricial".
Vamos então a um caso prático:
O Sr. José recebeu, através de partilha judicial, em nos anos 60 (do século XX) um prédio rústico chamado de Leira de Cima, inscrito na então matriz rústica sob o artigo 345, descrito na conservatória sob o nº 25.555. Nessa data o prédio tinha a configuração constante da imagem 1, com a área aproximada de 600 m2.
Ainda nos anos 60, pouco depois da partilha "comprou" verbalmente ao seu irmão o prédio rústico chamado de "Leira de Baixo", inscrito na matriz sob o artigo 346, sendo que nunca formalizou a escritura de compra e venda. O artigo 346 tinha também cerca de 600 m2.
Pouco depois do 25 de abril foi aberta uma nova estrada e antigo caminho deixou de ter "serventia", pelo que foi paulatinamente ocupado pelo Sr. José.
No início dos anos 80 tiveram lugar as avaliações gerais da matriz rústica e foi criado um só artigo que o perito calculou (a olho) ter 1600 m2, e atribuído um novo artigo rústico 1201.
Pouco depois Sr. José construiu uma pequena casa, que acabou por vir a ser inscrita na matriz sob o artigo urbano 999, sem que nunca tivessem atualizado a área do prédio rústico. A casa foi construída, em grande parte, sobre o terreno do que era o antigo caminho.
Em 1983 o Sr. José divorciou-se e nas partilhas ficou a casa para a ex-mulher e o artigo 1201 (rústico) para ele. Ninguém se preocupou em fazer registos.
Em 2022 o Sr. José faleceu, tendo como único herdeiro um filho de 2º casamento.
Parece confuso? ...mas também é habitual.
Tendo agora de fazer o "BUPI" / cadastro do artigo 1201 (rústico) o que devo georreferenciar?
- Os 600 m2 iniciais, que tinham artigo matricial e descrição predial?
- Os 1600 m2 que tinha o artigo 1201?
- Os limites atualmente detidos pelo herdeiro do Sr. José?
A esta 1ª pergunta não tenho dúvida em responder - apesar de inexistir norma expressa que o suporte - que deve ser georreferenciada a realidade material atual, ou seja, o polígono dos limites da parcela detida atualmente herdeiro do Sr. José, delimitada pelas respetivas estremas, relegando para uma 2ª fase a forma de alcançar a harmonização.
Validada que está a RGG (com 730 m2) temos então de harmonizar a informação de cadastro / matriz / registo, apresentando lado a lado a solução pragmática e a solução legal:
ABORDAGEM PRAGMÁTICA (ULTRAPASSAGEM PELA DIREITA)
- Outorga da escritura de habilitação de herdeiros;
- Requer o registo do artigo 1291, com 730 m2, como prédio "não descrito", declarando que: a) divergência provém de simples erro de medição e a configuração geométrica do prédio não sofreu alteração; b) Desconhece, por não ter de saber, a correspondência com a anterior matriz; c) Que o ante-possuidor estava na posse há mais de 20 anos; Custos com emolumentos / publicações: 0 Tempo: +- 15 dias Esforço: * |
ABORDAGEM PRAGMÁTICA
(COM ULTRAPASSAGEM PELA ESQUERDA) Procedimento especial de justificação de prédio rústico omisso (não descrito), explicando que a área atual do prédio é efetivamente de 730 m2, uma vez que parte indeterminada do artigo 1201 foi alienada, sem que possa determinar o seu destino.
- Declara que se desconhece a anterior situação matricial. Custos com emolumentos / publicações: 0 € Tempo: +- 6 meses (se arranjar uma conservatória que aceite fazer) Esforço: ** |
ABORDAGEM LEGAL
Justificação notarial com a explicação de tudo quanto se passou, com eventual notificação de titulares inscritos e alguns entraves quanto à violação da lei do fracionamento, loteamentos e usurpação do domínio público.
Custos com emolumentos / publicações: 500 € Tempo: +- 3 meses Esforço: ***** |
Volto então à pergunta. Se o decisor político sabe que é esta a realidade então porque não a assume de forma clara? Porque razão não é criado um quadro legal específico que permita um fortalecimento da presunção, eventualmente uma presunção plena?
Há mais de 10 anos que tenho vindo a defender a aplicação ao cadastro de um modelo legal idêntico ao do registo da mera posse (artigo 1295º do Código Civil), por forma a que consiga uma estabilização e compatibilização definitiva do objeto e do direito.
Há mais de 10 anos que tenho vindo a defender a aplicação ao cadastro de um modelo legal idêntico ao do registo da mera posse (artigo 1295º do Código Civil), por forma a que consiga uma estabilização e compatibilização definitiva do objeto e do direito.