DOMÍNIO PÚBLICO HÍDRICO - UM LOGRO COM MAIS DE 100 ANOS
27/06/2024
A história do domínio público hídrico (DPH) está sustentada numa sucessão de falsidades, propaladas como verdades, como sucessiva reutilização de fontes que nasceram enfermadas e transmitiram a doença para a geração seguinte.
Podemos dizer - sem qualquer margem de dúvida - que os sucessivos legisladores, de boa ou má-fé, sustentaram as suas opções não em factos históricos, mas em fabulações desses mesmos factos, encontrando fundamentos que eram impossível de existir na época.
A iniciativa de analisar este tema já há muito que se anunciava, mas só um recente evento, ainda que aparentemente insignificante, “forçou-me” a entrar e partilhar as “estórias” do DPH.
Podemos dizer - sem qualquer margem de dúvida - que os sucessivos legisladores, de boa ou má-fé, sustentaram as suas opções não em factos históricos, mas em fabulações desses mesmos factos, encontrando fundamentos que eram impossível de existir na época.
A iniciativa de analisar este tema já há muito que se anunciava, mas só um recente evento, ainda que aparentemente insignificante, “forçou-me” a entrar e partilhar as “estórias” do DPH.
No essencial o problema não reside na titularidade dos recursos hídricos mas antes na proteção dos recursos hídricos e como essa proteção afeta os direitos privados!
A burla que temos vindo a impassivelmente assistir, ao longo de mais de um século, é fundada na errada utilização de um decreto real de 31/12/1864 que determinou serem públicos os "portos de mar e praias os rios navegaveis e fluctuaveis com as suas margens" PDF .
Nunca aquele decreto real teve o propósito de regular a titularidade dos recursos hídricos mas antes regular as vias de comunicação, podendo-se alcançar esta preocupação através das portarias de 05/07/1848 e de 21/08/1850 (consultar secção de legislação)
A burla que temos vindo a impassivelmente assistir, ao longo de mais de um século, é fundada na errada utilização de um decreto real de 31/12/1864 que determinou serem públicos os "portos de mar e praias os rios navegaveis e fluctuaveis com as suas margens" PDF .
Nunca aquele decreto real teve o propósito de regular a titularidade dos recursos hídricos mas antes regular as vias de comunicação, podendo-se alcançar esta preocupação através das portarias de 05/07/1848 e de 21/08/1850 (consultar secção de legislação)
Em 1864 estávamos em plena revolução industrial. A primeira viagem de comboio havia sido realizada há tão só 8 anos e existiam tão só duas linhas, do Barreiro até às Vendas Novas e Setúbal. A primeira linha de telégrafo tinha também menos de 10 anos e ainda faltavam dois anos para a invenção do automóvel e ainda faltavam 14 anos para a estreia da iluminação pública na Cidadela de Cascais.
Tardavam os trabalhos de redação do viria a ser o primeiro Código Civil Português, cuja proposta de Lei é entregue em 1865.
É nesse contexto que que em 25 de junho de 1864 o Rei D. Luíz I autoriza o governo a decretar as medidas legislativas sobre os caminhos de ferro, telegrafia e sobre as estradas, rios, portos canais e “vallas”, pois mostrava-se urgente “precisar os direitos e obrigações do estado, das empresas e dos particulares…incertos d’estes grandes factos da moderna civilização"
Opta o governo por legislar autonomamente quanto aos caminhos de ferro e telegrafia, tendo o decreto 31 de dezembro de 1864 dedicado um artigo e um parágrafo ao tema da “água"
Tardavam os trabalhos de redação do viria a ser o primeiro Código Civil Português, cuja proposta de Lei é entregue em 1865.
É nesse contexto que que em 25 de junho de 1864 o Rei D. Luíz I autoriza o governo a decretar as medidas legislativas sobre os caminhos de ferro, telegrafia e sobre as estradas, rios, portos canais e “vallas”, pois mostrava-se urgente “precisar os direitos e obrigações do estado, das empresas e dos particulares…incertos d’estes grandes factos da moderna civilização"
Opta o governo por legislar autonomamente quanto aos caminhos de ferro e telegrafia, tendo o decreto 31 de dezembro de 1864 dedicado um artigo e um parágrafo ao tema da “água"
O tema da “água” acaba por ficar “enxertado”, certamente por que navegação fluvial tinha pouquíssima expressão na economia portuguesa.
As extensões de rios navegáveis eram parcas e inexistia integração fluvial com Espanha, ficando então os demais 60 artigos a versar sobre estradas, ruas e caminhos.
Ainda assim, a referência a “rios navegáveis e flutuáveis” resultou, indubitavelmente, da sua utilização – ainda que marginal - enquanto via de comunicação, muito particularmente enquanto suporte do tráfego comercial, sendo intelectualmente desonesto tentar retirar qualquer outro alcance, nomeadamente o de proteção dos recursos hídricos, ordenamento do território, proteção da costa, etc.
A referências às “margens” só pode ser enquadrada na utilidade das mesmas nas transporte, carga e descarga, uma vez que para “remontar” o rio era necessário que as barcas fossem puxadas a partir de terra, com pessoas ou animais que caminhavam ao longo das margens puxando a barca com cordas e cabos.
As extensões de rios navegáveis eram parcas e inexistia integração fluvial com Espanha, ficando então os demais 60 artigos a versar sobre estradas, ruas e caminhos.
Ainda assim, a referência a “rios navegáveis e flutuáveis” resultou, indubitavelmente, da sua utilização – ainda que marginal - enquanto via de comunicação, muito particularmente enquanto suporte do tráfego comercial, sendo intelectualmente desonesto tentar retirar qualquer outro alcance, nomeadamente o de proteção dos recursos hídricos, ordenamento do território, proteção da costa, etc.
A referências às “margens” só pode ser enquadrada na utilidade das mesmas nas transporte, carga e descarga, uma vez que para “remontar” o rio era necessário que as barcas fossem puxadas a partir de terra, com pessoas ou animais que caminhavam ao longo das margens puxando a barca com cordas e cabos.
Os sucessivos atropelos à propriedade privada acaba por ser parcialmente materializados em plena ditadura com o Decreto-Lei n.º 468/71 que vem estabelecer o seguinte:
- "margem das águas do mar - largura de 50 m
- águas navegáveis ou flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas ou portuárias- largura de 50 m"
- margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis tem a largura de 30 m
- margem das águas não navegáveis nem flutuáveis, tem a largura de 10 m.
- As pessoas que pretendam obter o reconhecimento da sua propriedade sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer águas navegáveis ou flutuáveis devem provar documentalmente que tais terrenos eram, por título legítimo, objecto de propriedade particular ou comum antes de 31 de Dezembro de 1864 ou, se se tratar de arribas alcantiladas, antes de 22 de Março de 1868 (artigo 8º)
O citado artigo 8º é uma verdadeira burla, que até se poderia compreender num contexto de uma ditadura, mas que no pós 25 de abril foi mantida e até mesmo aprofundada.
Nunca existiu qualquer norma anterior que tivesse determinado a dominialidade para 50 metros, mas os sucessivos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos em vindo a conseguir trapacear os sucessivos governos, omitindo, propositadamente, a realidade histórica.
Releva ler a portaria de 16/05/1898 PDF que reconhece a domínio e posse privada de "muitas, se não todas, as bacias hydrographicas do paiz":
Nunca existiu qualquer norma anterior que tivesse determinado a dominialidade para 50 metros, mas os sucessivos responsáveis pela gestão dos recursos hídricos em vindo a conseguir trapacear os sucessivos governos, omitindo, propositadamente, a realidade histórica.
Releva ler a portaria de 16/05/1898 PDF que reconhece a domínio e posse privada de "muitas, se não todas, as bacias hydrographicas do paiz":
“Considerando que é facto averiguado que em muitas, se não todas, as bacias hydrographicas do paiz muitos terrrenos submergidos, banhados ou attingidos pelas marés e os seus productos naturaes, têem estado sempre no domínio e posse, incontestada e publica, de individuos particulares, que os adquiriram por titulo gratuito oneroso, como heranças, legados, doações, compras e arrematações, algumas d'estas até feitas pela fazenda nacional, pagando elles por esses terrenos, inscriptos na matriz respectiva, as contribuições devidas á mesma fazenda…
Manda Sua Magestade El-Rei, pelo ministerio das obras publicas, commercio e industria, que se recommende aos directores das differentes circumscripções hydraulicas, seus subalternos e agentes, que na execução daquella legislação considerem e respeitem sempre os direitos dos proprietarios, adquiridos sobre quaesquer aguas, terrenos ou productos d'estes, emquanto superiormente se não definirem, por modo definitivo e justo, as relações entre o estado e aquelles proprietarios sobre tão importante assumpto.”
Também relevante o assento de uniformização de jurisprudência de 22/01/1935 que restringe a aplicação dos 261º e 281º do regulamento de 19 de Dezembro de 1892 (PDF) abrangem somente os terrenos pela lei considerados margens que pertençam ao domínio publico.
Pode consultar a legislação relevante e o "time line" aqui
A continuar brevemente...